A Vila das Carrapateiras era um local isolado do resto do mundo. As vastas plantações se derramavam diante dos olhos até onde a vista podia alcançar.
Em uma das enormes fazendas, vivia Marcos, um homem simples que trabalhava ali em troca de moradia e um pedaço de terra para plantar.
Ele era um homem de hábitos peculiares, muito trabalhador, mas nunca chegava ao trabalho antes do sol nascer e sempre ia embora antes dele se por, costumava desaparecer às sextas-feiras e durante a quaresma. O homem quase não falava com ninguém e nunca recebia visitas em sua pequena casa.
Certo dia, uma série de roubos começou a ocorrer em toda a região, e, quando a fazenda onde Marcos vivia e trabalhava foi atacada, seus patrões imediatamente o acusaram de ser o responsável pelos crimes.
O patrão, convencido de que tinha capturado o culpado, não quis esperar por julgamento. Já era quase noite e ele não esperaria o próximo amanhecer para que as autoridades tomassem uma posição. Junto com seus filhos, jogou Marcos em um celeiro, jurando que o faria confessar seus crimes e onde havia escondido o produto dos roubos.
Desesperado para provar sua inocência, Marcos sabia que precisava agir antes que a noite caísse e fosse tarde demais. Ele implorou ao patrão e seus filhos para ser solto, garantindo que não era o verdadeiro criminoso. No entanto, o fazendeiro permaneceu inflexível e jurou que, se o empregado não contasse a verdade, eles quebrariam todos os seus ossos.
Marcos, se desesperou ao ver os patrões trazerem uma velha corda. Eles amarraram seus braços e pernas, enquanto o empregado se debatia e implorava para que eles o ouvissem. Eles precisavam deixá-lo ir embora, ele repetia aos gritos.
Os filhos do patrão riam do desespero do homem, garantindo que ele não iria a lugar nenhum.
Nesse momento a noite se instalou. O sol se pôs e a penumbra tocou o velho celeiro. Marcos gritou, um grito de dor e desespero… e a transformação começou. A pele dele esticou-se, seus ossos rangeram e suas feições se distorceram em agonia enquanto sua maldição se manifestava.
A velha corda que o mantinham preso começou a se rasgar como se fosse feita da linha mais fina.
A fazenda mergulhou em um silêncio inquietante, interrompido apenas pelo uivo aterrorizante de Marcos transformado. Os patrões compreenderam que ele não estava implorando pela própria vida ou segurança. Ele queria proteger a eles!
Mas era tarde demais.
O patrão e seus filhos presenciavam o terror que haviam libertado, enquanto a criatura meio homem, meio lobo, se erguia na direção deles sem controle sobre os próprios instintos.
Em meio a rugidos e grunhidos, a verdadeira tragédia daquela noite se desenrolou. Quando o amanhecer finalmente quebrou a escuridão, Marcos retornou à sua forma humana, debilitado e exausto. A fazenda estava destruída e seus raptores mortos.
Restou ao homem ir embora da Vila das Carrapateiras para tentar viver em paz em outro lugar.