O problema da taxação de livros

Publicado por em 10 abr 21. Textos
Tempo estimado para leitura: 7 minutos

Esta semana, notícias sobre a taxação de livros no Brasil voltaram a ocupar espaço nos noticiários. A ideia deste projeto já havia sido motivo de discussão no final de 2020 e voltou a tona após a divulgação da versão 2 do documento Perguntas e Respostas da CBS pela Receita Federal.

Basicamente, na resposta “14. Por que a CBS será cobrada na venda de livros?”, o texto responde que os livros podem ser taxados na reforma porque a isenção deles não demonstra relação com a diminuição de preços e que livros não são consumidos pelos brasileiros mais pobres.

Não existem avaliações sobre que indiquem que houve redução do preço dos livros após a concessão da isenção da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins. Não foi identificada nem correlação entre uma coisa e outra, tampouco relação de causalidade entre a redução das contribuições e eventual redução do preço dos livros.
(…)
De acordo com dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2019 (POF), famílias com renda de até 2 salários mínimos não consomem livros não-didáticos e a maior parte desses livros é consumido pelas famílias com renda superior a 10 salários mínimos.

Trecho da resposta à pergunta 14.

Entendendo melhor a mudança

Há muito tempo se fala sobre a necessidade de uma Reforma Tributária que desonere os contribuintes e reduza a burocracia do sistema. A proposta da tributação dos livros é justamente parte de um projeto de reforma tributária.

Atualmente, a venda de livros e do papel destinado à sua impressão são imunes à cobrança de impostos, nos termos do art. 150, VI, “d” da Constituição Federal e a Lei 10.865 de 2004 os isenta de Cofins e PIS/PASEP.

Com a proposta, a nova Contribuição Social sobre Operações de Bens e Serviços (CBS) substituirá as contribuições para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e para os programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep). Essa mudança acaba com a isenção, taxando livros em 12%.

Mesmo não sendo chamada de imposto, essa contribuição tende a elevar os preços dos livros para o consumidor e consequentemente dificultar a cadeia do livro, já tão prejudicada pela pandemia enfrentada a mais de um ano.

O fato de chamarmos pagamentos obrigatórios de “contribuições” já seria alvo de um belo e extenso debate semântico que podemos fazer em um outro momento.

Os pobres não leem?

Parte da resposta do porquê taxar os livros se apoia na afirmação de que os mais pobres não consomem livros não-didáticos, citando como fonte a Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2019. Para fins de observação vamos verificar os dados da 5ª. Edição da Retratos da Leitura no Brasil

Na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil é considerado leitor apenas quem leu um livro (ou parte dele) nos últimos 3 meses antes da realização da pesquisa. Esse é um dado importante, porque a média e leitura dos brasileiros é de menos de 5 livros por ano.

A pesquisa mostra que 16% das pessoas com renda de até um salário mínimo e 20% das pessoas com renda entre um e dois salários mínimos, havia comprado livro nos últimos 3 meses.

Esses dados indicam que, além de ler, os mais pobres também compram livros. Assim, afirmar que a taxação de livros vai afetar apenas as camadas de população com rendas mais altas, se mostra um engano.

O impacto da taxação dos livros

Apesar do documento da Receita Federal falar de “livros não-didáticos”, atualmente, não há qualquer menção no projeto que exclua os livros didáticos da taxação, dessa forma esses livros, na maioria comprados com dinheiro público e distribuído em escolas, pode sofrer também com o aumento.

Segundo o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), a taxação poderá aumentar em até 20% o preço final do livro para o consumidor, o que torna essa medida, em resumo, um forte incentivo para o brasileiro ler menos, especialmente os mais pobres.

Pensar a questão do livro e de um país que, historicamente lê pouco, não pode ser analisado apenas como um problema econômico, precisamos pensar no que se espera do Brasil para as futuras gerações. Afinal, um país com baixa educação está fadado a ter também baixo desenvolvimento, inclusive econômico.

Temos que levar em consideração que há um ciclo de profunda interdependência entre o hábito da leitura e a educação. 45% dos entrevistados responderam ter dificuldades para ler porque não sabe ler, não compreende o que está lendo, não tem concentração para ler ou lê muito devagar.

A baixa leitura tem aspectos ligados a educação de má qualidade que não capacita a pessoa a ser um leitor competente.

Uma pessoa que não sabe ler bem, consequentemente não terá gosto por ler. Isso fará com que ela não saiba que precisa de livros. Além disso, a pessoa não lê não melhora sua educação. Enfim, temos um ciclo.

Para concluir

Seria óbvio que eu seria completamente contra qualquer tipo de iniciativa que reduzisse ou dificultasse o consumo de livros em nosso país.

Um país do tamanho do Brasil, se pretende alcançar desenvolvimento verdadeiro, precisa investir massivamente em educação e o acesso aos livros é uma parte importante deste investimento.

Olhando os números está mais do que provado que o livro alcança todas as classes sociais e, que se houver fomento e redução no valor, além de incentivos na educação, teremos ainda mais leitores.

A quem interessa que as pessoas não leiam?

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